Kyoto, 28 de Maio de 2012
Caro sequestrador, favor entregar essa carta em mãos, ao amor da minha vida. Obrigado.
Meu amor, meses atrás recebi um bilhete, um pedido de resgate. Nele o sequestrador exigia um preço muito alto, pedia o meu coração. Era aquele típico caso ''você ou ela''. E como eu não existia sem você, saí correndo, seguindo as instruções do bilhete.
O mais interessante era que você havia sido levada para o outro lado do mundo. Agora eu digo que é interessante, mas, na hora pensei: ''Será que eu chego lá?'' Você sabe, eu nunca fui de viajar e agora teria que dar a volta ao mundo. Eu já estava a caminho do aeroporto quando decidi reler o bilhete, e lá estava! ''Nada de vir de avião, ou ela morre!'' ''Droga, e como é que eu vou viajar pro Japão, se eu não posso pegar um avião? Qual é a desse cara?'', pensei. Não podia perder mais tempo, então voltei rapidamente pra casa e comecei a pesquisar outro meio de chegar até você.
Depois de muito tempo ''online'', acabei comprando um pacote em um cruzeiro intercontinental que, estranhamente, levaria dois meses e terminaria me deixando no Japão. Dois meses de viagem é bastante tempo, então, a cada três dias em alto-mar deveríamos ancorar em algum lugar. Foi tudo muito intenso! Moçambique, Iêmen, Índia, Austrália, Filipinas, Taiwan e Japão. Conheci tantas pessoas, línguas, tantos costumes e climas diferentes, era tudo novo. Não vou entrar em detalhes, senão vou me demorar muito.
Enfim, chegando ao Japão, peguei um metrô que me deixou em Kyoto, a mil quilômetros de você. Lá eu devia me dirigir até uma rua e pegar outro metrô, que, em algumas horas me levaria até minha missão. Mas como no Japão as ruas não tem nome, me perdi entre blocos e setores. Acabei sentado em um banco de praça. Fiquei lá por trinta minutos, mais ou menos, pensando sobre tudo o que estava acontecendo. Seu sequestro, o resgate era minha vida, dois meses viajando. Provavelmente eu já havia sido demitido, as contas lá de casa deviam estar atrasadas, a comida, estragado na geladeira; meu peixinho devia ter morrido na primeira semana sem ração. ''Por que eu estou aqui?'', esse foi o pensamento que me fez levantar daquele banco. Eu estava no Japão, era mês de Abril e as ruas estavam cobertas de flores de cerejeiras. Eu jamais tinha visto tantas paisagens belas, como as que vi nessa viagem maluca.
Comecei a questionar se valeria a pena eu estar ali somente pra morrer no seu lugar. Sabe como é, eu passei dois meses conhecendo pessoas com as quais valia a pena viver, e agora eu tinha que me entregar por você, minha amada. Sei não, pareceu meio idiota, afinal, eu não era o seu amado! Pelo menos foi o que você me disse naquela tarde em que eu me declarei pra você, ao som do carro de churros. ''Sinto muito, somos apenas bons amigos.'', foi você quem disse.
Comecei a me lembrar de tudo o que eu já havia feito por você no passado e, de tudo o que você fazia para que eu ''largasse do seu pé''. Bom, se você estiver lendo essa carta agora, é porque eu criei coragem. Criei coragem e não hesitei mais! Passei esse tempo todo vivendo para você e, como dizem por aí ''só se vive uma vez.''
Tomara que ainda dê tempo de viver um pouco mais, porque agora eu vou viver para mim. E quer saber? Talvez, um dia, eu me arrependa. Mas até lá, eu vou correr atrás do tempo que eu perdi enquanto corri atrás de você.
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